Até que ponto essa crise prejudica o setor prevencionista?
Realmente a crise prejudica sim o setor de Segurança do Trabalho. Nós tivemos uma redução de 3,8% no poder de compra em nosso país no ano de 2015. Pode parecer pouco mas o problema é que vem se acumulando. Esse foi o pior resultado em 25 anos. Isso mostra que muitas coisas que podíamos comprar, agora não podemos mais.
E não é só o trabalhador que sente com a crise. As vezes a gente pensa que o empregador tem muito dinheiro mas na verdade, não tem. As empresas também estão em dificuldades e por isso elas investirão menos em Segurança do Trabalho, isso é fato. Por exemplo, a queda na venda de veículos fez as empresas reduzirem a produção em 23% e demitirem quase 15 mil trabalhadores em 2015. Tivemos aumento da inflação, de desemprego, redução de 10% no setor de transporte terrestre... várias empresas estão relatando que esse é o pior ano da história delas.
Na Segurança do Trabalho, é preciso fazer uso de recursos. Não se faz Segurança do Trabalho apenas com vontade, são necessários recursos financeiros. Precisamos conseguir investimentos para nossas ações de Segurança e é aí que o bicho pega.
A crise faz a quantidade de empregos disponíveis diminuir. Segundo o SINTESP, o número de escolas de formação em SST mais do que quadruplicou. E, segundo ainda o SINTESP, hoje nós temos mais profissionais no mercado do que o setor consegue absorver. Sem a crise o mercado já estaria concorrido e com a crise a situação piora, milhares de trabalhadores estão perdendo seu emprego. No ano passado, só as empresas do ramo de veículos demitiram 15.000 trabalhadores. E infelizmente as empresas continuam demitindo.
Um dos setores que estão no topo da lista de corte de gastos, principalmente na crise, é a área de Segurança do Trabalho. E isso acontece pois a maioria das empresas no Brasil não tem uma cultura de Segurança. Infelizmente o empregador vai olhar e dizer que aquele TST não produz nada para a empresa, não faz uma peça, não solda, não cola, não assa biscoito no forno... o empregador não consegue perceber que nós estamos lá para cuidar de quem produz, garantir a segurança do trabalhador da sua empresa. A empresa pode reduzir a quantidade de profissionais em Segurança do Trabalho por 2 itens:
1 - Uma vez reduzindo o quadro de empregados, naturalmente e dependendo do tamanho da redução, ela vai, por força da norma, poder reduzir a quantidade de membros do SESMT.
2 - Por conta da crise ela pode ir diretamente nos profissionais do SESMT e demitir alguns deles ou no caso da empresa que só tem o TST, demiti-lo. E neste caso, a empresa estaria indo contra a legislação pois se ela tem em seu quadro de empregados a quantidade de empregados necessária para ser obrigatório contratar um TST, ela precisa mante-lo independente do fator crise.
Ficou mais difícil conseguir recursos para a área de SST mas não ficou impossível. É claro que cada empresa age de uma forma e não existe uma fórmula que valesse para todas as empresas mas temos algumas premissas básicas para quem precisa buscar investimentos em SST dentro da sua.
O que fazer?
É preciso conseguir convencer o empregador que investir em SST vai diminuir os prejuízos ou gerar lucro para a empresa. Não é uma tarefa simples.
Vou contar uma história pra vocês, real. Um colega lá de Curitiba chegou para a dona da empresa e disse que era preciso montar a CIPA devido ao aumento do número de empregados. Ela recusou de imediato, disse que não queria saber de CIPA pois o sindicato iria querer mandar na empresa, os trabalhadores teriam estabilidade, etc. O colega, que é consultar na área de SST, foi embora. Poucos dias depois ele voltou a procurar a dona da empresa novamente dizendo dessa vez que no lugar dela, montaria 2 CIPAS. A mulher não entendeu nada.
- A CIPA vai diminuir a quantidade de acidentes de trabalho. Por conta disso, serão menos afastamentos, menos gastos com remédios para profissionais acidentados, menos contratação de mão de obra temporária, menos encargos do INSS, menos problemas na justiça e eles também vão trabalhar para evitar as doenças ocupacionais da sua empresa.
A dona da empresa então concordou em montar a CIPA, mas disse cautelosamente para montar apenas 1.
Repare que esse foi um caso que ele mostrou com argumentos que a CIPA é importante para a empresa, coisa que muitas vezes o profissional de SST não faz.
Esse exemplo, até foi um bom exemplo, mas é possível melhorar. Vamos supor que seja necessário colocar uma proteção em uma máquina do setor de açougue. Como vou convencer o empregador a colocar uma proteção ali?
É preciso mostrar exemplos de acidentes reais que já aconteceram, mostrando o impacto que isso causou na empresa. Quantos dias em média um trabalhador que sofre o acidente naquela situação fica afastado. Se ele entra na justiça, quanto em média seria o gasto com essa burocracia. É muito importante o profissional de SST entender que o trabalho dele vai muito além de simplesmente entregar EPI na empresa. Essa é apenas uma das atribuições desse profissional. Ele precisa ir muito além disso, fazer gestão é lidar com números, ter bons argumentos e assim convencer o empregador a investir em Segurança no Trabalho.
Outro exemplo: ruído.
- Nós temos ruído elevado aqui na empresa e precisamos enclausurar um gerador que está causando esse problema.
É preciso mais do que mostrar quanto o empregador vai pagar de multa pois ele sabe que a fiscalização do MTE é precária. Sabe que dificilmente o auditor vai nas empresas.
Qual argumento que valeria? se estou falando de ruído, estou falando provavelmente de insalubridade. Vamos então somar o valor da insalubridade de todos os trabalhadores que estão trabalhando no ambiente e comparar com o valor que será empregado para fazer o enclausuramento do ruído. Vamos somar os valores de insalubridade e desse impacto na folha de pagamento também, pois sabemos que isso vai causar outros impostos.
Somar também o gasto que ele tem com proteção auditiva, com exames audiométricos, treinamentos para uso de EPI. Viu quantos ítens já levantamos aqui?
Levante todos esses ítens, tudo que isso custa para o empregador e no final das contas a conclusão é que sai bem mais barato enclausurar o gerador do que fornecer proteção auditiva. Esse exemplo vale para todos os segmentos, basta você adaptar.
É possível sim fazer um bom trabalho na área de SST mesmo com a crise. Claro que existirá mais dificuldade mas vida que segue. Não adianta ficar paralisado, é preciso se levantar, fazer a sua parte, o seu melhor.
Nestor W. Neto, TST
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