(NR-7 PCMSO) TRABALHAR A NOITE: REVISÃO COM 2 MILHÕES DE PESSOAS
imagem: revista época.globo.com
Trabalhar à noite, ter horários de trabalho irregulares ou fazer plantões de madrugada — ou seja, trabalhar em turnos, geralmente em serviços que funcionam 24 horas por dia — pode levar a problemas cardiovasculares graves, como infarto ou acidente vascular cerebral (AVC), indicou um novo estudo publicado neste final de julho (2012) no site da revista British Medical Journal (BMJ). A pesquisa, realizada por uma equipe de especialistas canadenses, noruegueses e suecos, é a maior já feita sobre o assunto e, ao todo, envolveu mais de dois milhões de pessoas.
Segundo estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente cerca de 20% das populações dos países desenvolvidos trabalham no período da noite. Nos Estados Unidos, cerca de 25% dos trabalhadores trabalham em turnos alternantes. Esses profissionais perdem cinco anos de vida para cada quinze anos trabalhados. ISMA (International Management Stress Association), realizou um estudo no Brasil no qual constatou que 40% dos trabalhadores que exercem sua atividade no turno da noite desenvolvem algum distúrbio na visão.
Segundo os resultados, as pessoas que trabalhavam em turnos apresentaram 24% mais riscos de terem uma doença coronariana; 23% mais chances de sofrerem um ataque cardíaco; e 5% mais chances de terem um AVC do que as outras. Especificamente, a jornada de trabalho noturna foi associada a um risco 40% mais elevado de doença coronariana. As mulheres são mais vulneráveis e o risco aumenta entre 40 a 70%. Pesquisadores da Escola de Saúde Pública da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, afirmam, ainda, que o trabalho noturno pode ser um fator de risco para desenvolver diabetes. Além disso, quem trabalha à noite fica predisposto a engordar. Isso porque, de acordo com um estudo da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o turno noturno provoca alterações hormonais que fazem com que o organismo não reconheça mais sinais de saciedade. (imagem: setrab.com.br)
No Brasil, 15 milhões de pessoas trabalham no período noturno, segundo estimativa do Instituto do Sono da Universidade Federal de São Paulo, baseada em dados do Ministério do Trabalho. Médicos e cientistas já haviam alertado em estudos anteriores sobre o maior risco para doenças cardíacas, depressão e obesidade em pessoas que trabalham à noite ou em turnos irregulares.
A Constituição Federal estabelece que os direitos de remuneração do trabalho noturno devem ser superiores ao do diurno. Na maior parte das vezes o retorno financeiro é que leva alguém a trocar o dia pela noite. É a mesma coisa dos “adicionais” de insalubridade, a legislação é permissiva e conivente com os interesses econômicos, e legitima a chamada “monetização do risco”. Entretanto, a conta vai ser paga mais tarde, com o ônus dos serviços de saúde pública para atender as doenças do stress ou da previdência para pagar as incapacidades temporárias ou definitivas.
TRIAGEM E AVALIAÇÕES
Para os pesquisadores, essas descobertas devem incentivar a criação de programas de triagem que identifiquem fatores de risco para doenças do coração entre pessoas com maiores riscos — como, por exemplo, indivíduos que já apresentam pressão ou colesterol altos. Estas serão novas tarefas para o Médico do Trabalho na elaboração do PCMSO, como veremos abaixo.
Outros dados sobre o assunto aparecem em Estudo publicado pelo Instituto de Medicina Ocupacional da Universidade de Verona, em trabalho de Giovanni Costa (publicado em 1999), e que aponta os principais riscos:
Distúrbios no ciclo biológico de 24 horas (circadiano), provocando sonolência no trabalho e aumentando o risco de acidentes; |
Interferências na performance e eficiência no trabalho, resultando em mais erros e acidentes |
Dificuldade em manter relacionamento estável com a família e o ambiente social |
Distúrbios no sono e nos hábitos alimentares, principalmente ganho de peso; tardiamente pode determinar problemas mais severos na área gastrintestinal (colite, úlcera), neuropsiquiátrica (fadiga crônica, crises mais frequentes de ansiedade e depressão) e cardiovascular (hipertensão, doenças do coração); |
Os riscos são maiores nas mulheres, em 70% a mais para um infarto |
Considerando que o maior risco é para as mulheres, é interessante lembrar a Convenção da OIT, de 1919 que foi ratificada no Brasil em 1935, a qual proibia aos paises signatários o trabalho da mulher em diversas atividades industriais (veja a Convenção).
ALTERNATIVAS
Mas, uma vez que a oferta desse tipo de trabalho é inevitável, quais os aspectos principais a considerar para decidir sobre aceitar um trabalho noturno? especialistas afirmam que o profissional deve avaliar, sobretudo, se a oportunidade está em sintonia com seu projeto pessoal, se oferece oportunidade de desenvolvimento de carreira.
Embora seja no período noturno, existem posições de supervisão, coordenação e gerência, ou seja, cargos de níveis estratégicos. Na prática, segundo o especialista, se você puder escolher entre uma posição de gerência no período noturno e uma como coordenação no período convencional, vale à pena considerar a primeira opção.
Para evitar os problemas, médicos e pesquisadores aconselham o trabalhador que se queixa de irregularidade no sono a manter horários de dormir mais regulares. Também é importante que a empresa permita pequenos cochilos durante o horário de trabalho, quando possível. Quanto à dieta, deve-se planejar melhor o horário das refeições e a qualidade dos alimentos; problemas cardíacos podem ser evitados com a melhor qualidade de vida, relaxamento, prática de atividade física e maior exposição à luz natural.
IMPORTÂNCIA DO PCMSO (NR-7)
imagem: yeling.com
Para os trabalhadores em atividades de turnos alternantes ou noturnos, o Médico do Trabalho poderá utilizar de forma mais frequente testes psicométricos e exames de laboratório mais específicos, como, por exemplo, o PCR, colesterol e triglicerídeos, utilizados na predição de risco cardiovascular e a glicemia (para diabetes). Antecedentes de distúrbios neurológicos e/ou psiquiátricos devem ser considerados na conclusão sobre a aptidão do trabalhador candidato a trabalho em turnos noturnos ou em turnos alternantes. A NR confere liberdade ao Médico para incluir em sua avaliação outros exames não necessariamente de rotina. Veja abaixo infográfico da NR-7 (PCMSO) sobre o assunto. Ao abrir a pasta da NR-7 no site NRFACIL, clique no Remissivo e procure o item Desenvolvimento do PCMSO. Entre outros regulamentos, estabelece a possibilidade de que o Médico do Trabalho possa solicitar outros exames não necessariamente de rotina:
ASPECTOS NEUROFISIOLÓGICOS
O EEG, por exemplo, poderia ser utilizado pelo Médico do Trabalho para avaliar a integridade neurofisiológica de trabalhadores após um período de trabalho em turnos alternantes ou trabalho noturno. Assim, o indivíduo, mesmo sem ter problemas neurológicos, pode apresentar alterações no EEG por privação de sono indicando assim mecanismos insatisfatórios de repouso e recuperação da fadiga, existindo ainda casos de crises convulsivas por privação de sono. A predisposição para crises convulsivas aumenta ainda mais com o uso de alguns antiinflamatórios e antidepressivos, medicamentos utilizados com frequência por pessoas que estão sofrendo stress do trabalho noturno, tensão neuromuscular e dores articulares. Uso de bebida alcoólica potencializa esses efeitos. Outras consequências importantes da privação de sono são a redução da atenção e a sonolência. O Engenheiro e o Técnico de segurança podem desenvolver monitoramento e registro de incidentes de trabalho em setores relacionados a turnos alternantes encaminhando trabalhadores para a realização de avaliações de saúde mais frequentes e não apenas para as situações de riscos insalubres (avaliação semestral) como determina a NR-7.
ENFERMAGEM E ASSISTENTE SOCIAL DO TRABALHO
(imagem cftelshadai.com.br)
A Assistente Social e a Enfermagem do Trabalho podem avaliar situações sócio-familiares de risco e orientar no sentido de serem adotadas medidas para que o trabalhador possa dormir de maneira confortável durante o dia. Verificar, tambem, a situação familiar, solteiro ou não, presença de um ou vários filhos, visto que constituem fatores normalmente agravantes dos problemas do trabalhador noturno. As mulheres casadas e tendo normalmente um filho, dormem ao dia em torno de uma hora e meia a menos que as solteiras. O débito de sono é ainda mais marcante quando se trata de mães com crianças em fase de amamentação. Por outro lado, a desproporção das divisões das tarefas do lar entre casais contribui igualmente para aumentar os problemas dos horários do trabalho noturno feminino e a carga global de trabalho suportada. Esses diversos elementos da situação fora do trabalho devem ser levados em consideração no momento da organização do horário e da prescrição das tarefas no trabalho noturno. Finalmente, pode ser adotada a prescrição de períodos mais longos entre os turnos, tornando a alternância mais espaçada.
Devem, também, ser considerados fatores em relação à idade do trabalhador noturno. O envelhecimento modifica a sensibilidade às rotações de turno de maneira geral e em particular ao trabalho noturno não rodiziante. Os turnos alternantes tornam tambem maiores os riscos de pacientes suscetíveis desenvolverem surtos psicóticos gerando incapacidade laboral mais longa após o surto.
Na área dos serviços de saúde (NR-32) a situação é mais crítica, devido à prática inevitável dos turnos alternantes. Os Enfs Marziale e Rozestraten (Rev Latin-Am Enfermagem – Rib Preto, v.3 p. 59-78, jan 95) realizaram interessante estudo sobre sintomas subjetivos de fadiga projetando em uma tabela sintomas como dificuldade de pensar, irritabilidade, sensação de cometer erros, olhos ardendo, vontade de dormir, sem vontade de falar, impaciência, voz rouca, sintomas esses relacionados aos turnos alternantes de trabalho.
Veja post anterior deste Blog sobre o assunto (TURNOS ALTERNANTES)
Prof. Samuel Gueiros,
Med Trab, Coord NRFACIL
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