(NR-5 CIPA) CULPA E RISCO EM ACIDENTE DE TRABALHO
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CULPA E RISCO EM ACIDENTE DE TRABALHO
Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho
(Lei nº. 8.213/1991)
Atualmente, uma das maiores fontes de referência para a atenção dos gestores em SST não são apenas as regras contidas nas NRs. Atenção maior deve ser dada cada cada vez mais para as decisões da Justiça do Trabalho, que tem dado novos encaminhamentos e lições relativamente às questões de segurança e saúde no trabalho.
Em alguns casos, a Justiça acaba modificando a própria NR. Foi o caso de pendências ligadas à periculosidade, quando a Justiça modificou uma das regras sobre o assunto no setor elétrico. Neste caso, a periculosidade não ficou limitada apenas ao tempo de exposição do trabalhador. De fato, pelo ordenamento jurídico atual do país, é da Justiça do Trabalho a competência ampla para avaliar e julgar todas as pendências ligadas aos ambientes de trabalho, inclusive as relativas à reparação, e entende que o cumprimento das normas de segurança está atrelado ao próprio contrato de trabalho.
Nesse contexto, faz-se necessário abordar a discussão sobre as questões da culpa e do risco nos acidentes de trabalho. Em seguida, registramos alguns casos exemplares dessas situações.
TEORIAS
No conceito da teoria da culpa, a responsabilidade de indenizar decorre de ato ilícito cometido por negligência, imprudência ou imperícia – geralmente quem perdia com essa teoria era sempre o trabalhador, que não tinha recursos para provar a culpa da empresa ou a sua inocência.
Na teoria do risco, há o dever de indenizar independentemente da existência de culpa e assim aumentaram sensivelmente as responsabilidades do empregador. É inclusive do empregador a responsabilidade legal de reparação civil de atos de seus empregados, assim como um pai é responsável legal por atos de seus filhos menores.
Entretanto, existem casos em que o acidente do trabalho nem sempre decorre de dolo ou culpa do empregador. Por vezes, decorre de fatos ou atos estranhos à relação do trabalho; são causas imprevisíveis ao contrato, denominadas de caso fortuito ou força maior; por exemplo, caso fortuito é um fato da natureza, irresistível e inevitável em seu efeito, que dando causa a um acidente do trabalho exclui qualquer responsabilidade do empregador. Já a força maior é um ato imprevisível e de efeito irresistível, também excludente de responsabilidade. Um raio, um temporal, um terremoto são casos fortuitos, enquanto que uma greve, uma rebelião, uma invasão caracterizam força maior (imagem: topsegurovida.com.br).
Entretanto, em diversas ações judiciais em acidentes e doenças do trabalho, as duas teorias estão presentes, atribuindo tanto ao empregado quanto ao empregador mútua responsabilidade. E assim surgem processos que abordam as questões de CULPA CONCORRENTE e a CULPA RECÍPROCA.
Nessas ações, observa-se que se a conduta do empregador foi regular, correta, cumprindo as normas e preceitos cabíveis, o acidente pode decorrer da própria conduta indevida do empregado. Neste caso, a culpa pelo acidente é do próprio trabalhador, que significa, ainda, excludente de responsabilidade do empregador. Estas excludentes são normalmente aceitas na justiça trabalhista. Pode ocorrer, ainda, que empregador e empregado têm culpa recíproca no acidente do trabalho. Nestes casos, há uma co-responsabilidade no acidente do trabalho, arcando o empregador com a reparação do dano, só que com valores atenuados em virtude de culpa também do próprio acidentado.
Abordamos aqui alguns casos exemplares.
CULPA RECÍPROCA, CIPA E USO DE EPI
O TST (Tribunal Superior do Trabalho) reconheceu a existência de culpa recíproca em um acidente de trabalho. A sentença proferida pela 4ª Turma do Tribunal responsabiliza igualmente o empregado e o empregador.
Na ocasião, ao demiti-lo por indisciplina, a empresa argumentou que, no momento do imprevisto — que causou queimaduras nele e em um colega —, o empregado optou pelo uso de luvas de couro, ao invés de vestir as de borracha, que dificultavam o tato. A empresa alega que o eletricista estava ciente de que o equipamento mais indicado, e colocado à sua disposição para o serviço, eram as luvas de borracha.
A sentença do TST manteve a demissão, mas, ao dividir a culpa pelo acidente, obriga a empresa a arcar com 50% dos encargos indicados pelas leis trabalhistas. O eletricista terá direito a receber metade do valor do aviso-prévio, do 13º salário e do montante relativo às férias proporcionais ao fim do contrato. A previsão está no artigo 484 da CLT (Consolidação das Leis de Trabalho) e na Súmula 14 do TST.
O relator da ação no TST, afirmou que a decisão da Turma tem objetivo pedagógico, pelo fato de que o empregado havia sido membro suplente da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes). Ele teria, portanto, a tarefa de orientar os colegas sobre segurança no trabalho e utilizar os equipamentos adequados. (foto: trabalhodecente.org)
CULPA RECÍPROCA E TREINAMENTO: O Tec Seg ESTAVA AUSENTE
Acompanhando voto da Desembargadora Denise Alves Horta, a 8ª Turma do TRT-MG condenou uma empresa a pagar indenização por danos morais e materiais a empregado que sofreu acidente no local de trabalho, ocasião em que perdeu a parte inferior da perna esquerda. A empresa alegou que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do reclamante, que não observou as regras de segurança do trabalho e, por isto, pretendia que, no mínimo, fosse reconhecida a responsabilidade concorrente do empregado.
A tese da defesa era de que o empregado recebia treinamento técnico específico, sendo constantemente supervisionado por profissional de segurança do trabalho, e que por comodidade preferiu utilizar uma ferramenta denominada “aranha” para alçar uma caixa com a produção de ferro, de 3.000 quilos, quando o correto seria a utilização de cabos de sustentação, que dariam maior equilíbrio à caixa. Ao ser suspensa na ponte rolante, a caixa pendeu em direção ao reclamante e prensou sua perna esquerda, esmagando-a.
A perícia constatou, entretanto, que nem os cabos impediriam que a carga pendesse para um lado ou outro em caso de posicionamento desnivelado da ponte, confirmando que a causa do acidente havia sido a realização de uma operação de risco em um ambiente inseguro. A prova oral também revelou que era comum a utilização da aranha para retirar as caixas de ferro e que, no dia do acidente, os cabos de sustentação não foram usados porque não estavam disponíveis. Alem do que, a ponte rolante estava com defeito e o técnico de segurança não se encontrava no local no momento do acidente.
A Relatora acrescenta que cabe ao empregador a orientação e constante fiscalização, com o objetivo de reduzir os riscos de acidente, propiciando condições seguras para o trabalho. Sendo assim, a deformidade permanente do empregado e redução de sua capacidade laborativa “afigura-se como fato gerador de indenização por parte de quem, por ação ou omissão, contribuiu para o evento”. (foto: blog.cellep.com).
CULPA RECÍPROCA, EPI E QUALIFICAÇÃO
Uma empresa de construção civil permitiu, ainda que tacitamente, que empregado seu cortasse madeira utilizando-se de uma máquina específica para o corte de cerâmica (MAKITA) sem o uso dos EPI’s necessários e eficientes. A Justiça decidiu que deve ser reconhecida sua culpa no acidente de trabalho que ocasionou a amputação do dedo polegar da mão esquerda do trabalhador, ainda que ele estivesse utilizando de disco de serra apropriado, considerando que o mercado faz distinção entre uma e outra máquina, em razão das peculiaridades de cada tipo de produto, cerâmica ou madeira.
Por outro lado, agiu com culpa também a vítima, pessoa experiente na função que exercia de pedreiro, que deixou de adotar os cuidados necessários ao efetuar o corte de madeira com uma máquina específica para o corte de cerâmica, porque deduz-se que a sua habilidade poderia ter indicado que a ausência de proteção da máquina, que seria própria da máquina específica para madeira, assim como a não utilização de luva adequada, exigiria, no mínimo, cuidado redobrado. Deve, portanto, ser reconhecida a culpa recíproca ou concorrente das partes na ocorrência do acidente de trabalho, e como tal, analisar os pedidos de indenização por danos materiais e morais considerando essa circunstância e de acordo com as provas dos autos.
CULPA CONCORRENTE E DESVIO DE FUNÇÃO
Em um outro caso, o empregado perdeu três dedos quando trabalhava com uma ferramenta elétrica, contudo o mesmo afirmou que foi contratado para exercer uma função, porém acabou sendo desviado. Por sua vez, a empregadora alegou que apesar do empregado realizar outras atividades para as quais não tinha sido contratado ela nunca teria autorizado o uso da ferramenta elétrica e que o empregado a utilizou por conta própria.
Conforme o desembargador José da Fonseca Martins Junior, relator do recurso ordinário, “a reclamada, através de outro empregado, jamais poderia permitir que o autor fosse desviado de sua função, sem ter conhecimento pleno sobre o trabalho a ser realizado e que, a toda evidência, prescindia de acompanhamento, orientação, fiscalização e fornecimento de equipamento de proteção individual (EPI) pela demandada que, não o fazendo,agiu de forma negligente.
No presente caso houve a confirmação da culpa concorrente com a fixação de indenização na proporção da culpa das partes, em conformidade com o artigo 945 do Código Civil. (imagem: literaturasemfronteiras.blogspot.com).
CULPA RECÍPROCA E DISTRAÇÃO
(COMPLACÊNCIA)
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao recurso de um empregado que responsabilizava empresas pelo acidente de trabalho, Ele teve a ponta do dedo indicador da mão direita esmagado quando operava uma máquina. O empregado pediu a condenação das empresas por danos morais, materiais e estéticos. A decisão do TST manteve o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que considerou que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do empregado.
O trabalhador foi contratado para prestar serviços terceirizados, na função de operador de máquina na fabricação de peças. Na audiência na vara do trabalho, afirmou que ao efetuar ajustes em uma das máquinas a correia de uma delas teria ricocheteado em direção à sua mão, causando o acidente.
Porém, o laudo pericial médico realizado com base nos exames clínicos e nas informações prestadas pelas partes comprovou que o acidente teria ocorrido por culpa exclusiva do empregado, que teria se distraído no momento do acidente deixando a mão exposta próxima à corrente que acabou prendendo a luva que ele usava esmagando a ponta do dedo. Ainda, segundo o laudo, não houve prejuízo de ordem material ao empregado que foi considerado apto ao trabalho, sem nenhuma restrição.
Dessa forma a sentença excluiu as empresas da responsabilidade pelo acidente. O empregado recorreu ao TRT que, confirmou a decisão. O regional considerou que diante da confissão do próprio autor da ação, pode-se verificar que o acidente não teria ocorrido por mau funcionamento do maquinário, tampouco por inexperiência do empregado, mas sim, por descuido e distração no momento do acidente.
O acórdão regional foi taxativo ao afirmar que a lesão sofrida ocorreu por culpa exclusiva da vítima, não ficando demonstrada, segundo os laudos, a culpa da empregadora. Para o ministro esta situação excluiu as empresas da responsabilidade pelo acidente.
INEXISTÊNCIA DE CULPA CONCORRENTE ENTRE EMPRESAS
Uma empresa recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho e conseguiu se livrar da condenação relativa a um grave acidente de trabalho que vitimou três trabalhadores na construção de um Shopping.
A empresa A foi subempreitada pela empresa B para realizar a elaboração de projetos, fornecimento e montagem da estrutura premoldada de concreto armado do empreendimento. Em meados de 2006, a construção desabou e causou o acidente. A empresa pediu a condenação da subempreiteira, por indenizações decorrentes do acidente de trabalho.
No primeiro caso foi decidido por culpa concorrente mas a empresa subempreiteira recorreu à Instância superior, insistindo na incompetência da Justiça do Trabalho no seu caso, pois o contrato de empreita era de natureza civil e comercial e não de trabalho.
Ao examinar recurso na Quinta Turma do TST, o relator deu-lhe razão, reformou a decisão regional e concluiu que a questão não se enquadra na nova competência da Justiça do Trabalho que foi estabelecida pela Emenda Constitucional nº 45/2004.
CONCLUSÃO
Deve-se enfatizar nos programas de segurança que a Justiça não está mais sendo nem tão patrimonialista como no passado (apenas privilegiando a empresa) e nem tão paternalista quanto até há pouco tempo atrás (privilegiando o empregado como se o mesmo fosse sempre a eterna vítima de patrões inescrupulosos). Existem empresas que cumprem regras de segurança de forma rigorosa, cobram o uso do EPI e punem empregados negligentes ou imperitos. É claro que na sua grande maioria, as empresas ainda são as grandes responsáveis pelos acidentes e doenças do trabalho, pela falta de investimento adequado nos programas e equipamentos de segurança bem como pela falta de observância das NRs.
Em todos os casos, Emenda Constitucional garante à Justiça do Trabalho a competência exclusiva para decidir sobre pendências trabalhistas de qualquer natureza, incluindo reparação. Entretanto, há algumas exceções, quando se trata de acidentes que envolvam contratos civis e comerciais entre empresas.
Os profissionais do SESMT devem estar atentos as decisões da Justiça de forma ao melhor desenvolvimento de ações de prevenção de acidentes e doenças do trabalho.
Por mais que a palavra “culpa” tenha ficado fora das teorias de acidentes e investigação de acidentes, na hora em que a situação vai parar na Justiça, essas teorias não são levadas em conta, e sim, o entendimento dos Juízes e as evidências de perícias.
Prof. Samuel Gueiros, Med Trab, Coord NRFACIL
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Muito esclarecedor o assunto abordado , parabéns.
matéria muito boa , sou recém formada em segurança do trabalho, e pesquiso bastante, se possivél mandar via email mais matérias. agradeço atençao .
Olha pessoal, o melhor investimento que já fiz nos últimos tempos