NR-18 (PCMAT) e NR-35 (TRABALHO EM ALTURA): ANALISANDO OS ACIDENTES NOS ESTÁDIOS DA COPA
Foto: Folha de São Paulo
trabalhadores sobre as estruturas metálicas
Em Manaus, mais um acidente na Arena da Amazônia, que certamente vai para o arquivo dos acidentes “padrão FIFA” no Brasil: F.oi I.mprudência, F.altou A.tenção…
O Ministério Público do Trabalho pediu a interdição urgente e imediata das obras, principalmente de todos os setores que envolvem atividades em altura.
Diante dessa situação é de se perguntar: porque esses acidentes de trabalho em altura no primeiro ano da vigência da nova NR-35 em obras tão importantes? E logo nas obras que são as vitrines do Governo na área de SST? Faça-se idéia o que deve estar ocorrendo em outras obras sem grande visibilidade.
Desenvolvemos aqui algumas análises desses acidentes e reiteramos a proposta para a criação de Agentes de Segurança no Trabalho nos Estados e Municípios que, a exemplo dos Agentes de Saúde Pública, poderiam complementar as ações da Auditoria Fiscal com atribuições muito mais de antecipar comportamentos inseguros e de apoio técnico às empresas. Trata-se de iniciativa com respaldo na CLT.
Todas as estatísticas apontam que mais da metade dos acidentes fatais, como os que estão ocorrendo nos Estádios, é oriunda da construção civil. E que 40% das fatalidades ocorrem no trabalho em altura. O problema básico aponta muito mais para o descumprimento da NR-18, onde inclusive já existem regulamentos para o trabalho em altura que não são observados.
Estudos técnicos em cerca de 93 empresas em diferentes cidades, mesmo entre aquelas de melhor nível gerencial e tecnológico, demonstraram que a NR-18 ainda é muito pouco cumprida nos canteiros de obras (índice médio de cumprimento entre 51 e 55%). Alega-se que uma das prováveis causas para o não cumprimento da NR-18 é o “caráter muito prescritivo de algumas exigências, que facilita a não conformidade e dificulta a adoção de soluções alternativas”.
Em outra investigação sobre PCMAT com 14 grandes e médias obras de construção civil, apenas quatro (28,6%) dizem elaborar e seguir as recomendações do PCMAT. Neste Estudo, as empresas afirmavam que tinham um bom conhecimento sobre a NR-18, mas não implantavam o PCMAT.
Além disso, os acidentes por queda de altura, ocorrem muito mais na categoria profissional de servente, ou seja, são trabalhadores desqualificados e em grande parte à margem dos programas de treinamento, e que “rodam” por toda a obra.
Um outro motivo são as inovações tecnológicas não absorvidas por trabalhadores desqualificados. Algumas das evoluções tecnológicas atenuaram os riscos em alguns processos, mas aumentaram em outros. Ou seja, inovação sem treinamento é investir em acidente.
Influenciam ainda a competitividade do mercado e a necessidade de aumento da produtividade e de redução de custos através do cumprimento dos cronogramas previstos. Para atender a essas exigências, as empresas utilizam-se “da contratação de subempreiteiras, do recurso às horas-extras, do trabalho noturno e do pagamento por produção”.
Pesquisadores justificaram as principais falhas do PCMAT:
sua implementação é considerada como uma atividade extra a gerentes, já que não é integrada a atividades de gerenciamento da produção. A NR- 18 não requer sua integração a outros planos, com exceção do planejamento do canteiro; |
é normalmente elaborado por peritos externos que não trabalham em uma base permanente para a empresa, não envolvendo os gerentes de produção, subcontratantes ou trabalhadores; |
normalmente não é um plano exaustivamente detalhado. É produzido no começo da fase de execução não sendo atualizado conforme a necessidade da produção; |
raramente é feito o controle formal de implementação de PCMAT; |
enfatiza proteções físicas, negligenciando as ações gerenciais necessárias para alcançar um ambiente de trabalho seguro; |
não induz eliminação de risco por medidas preventivas à fase de projeto |
Finalmente, há problemas nessas obras de uma grande quantidade de trabalhadores em uma área restrita e à co-produtividade de diferentes profissionais, sobrepondo os riscos em um mesmo local. Ocorrem tambem duplas jornadas de trabalho dos operários que contribuem para diminuir a atenção e os reflexos.
Nesses Estudos, houve unanimidade na afirmação dos trabalhadores e técnicos das obras estudadas de que a fiscalização tem papel determinante na atenção dispensada à segurança e higiene nos canteiros, ou seja, quanto mais freqüente a fiscalização, mais medidas de melhoria são tomadas.
É preciso tambem aumentar o valor das multas, visto que, mesmo com a fiscalização, as empresas negligenciam suas obrigações. Desde 2012, os fiscais do Ministério do Trabalho vêm encontrando irregularidades na Arena e a construtora Andrade Gutierrez chegou a firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no qual ela se comprometia a cumprir 22 cláusulas que visavam oferecer condições seguras de trabalho aos operários. Em janeiro, no entanto, o Ministério Público do Trabalho realizou uma fiscalização surpresa e constatou que pelo menos 15 delas haviam sido descumpridas. Entre as irregularidades encontradas, estão a não utilização de equipamentos de proteção coletiva em locais com risco de queda. Esse tipo de irregularidade pode ter originado os dois acidentes fatais. E ao determinar a interdição da Obra o Ministério Público exigiu o pagamento de R$100.000,00 por dia em caso de descumprimento. Na maioria dos países até mesmo as fianças por delitos comuns são altas mas no Brasil multas por descumprimento de NRs só oneram as pequenas empresas.
E para completar este quadro preocupante, estudos mencionam que infelizmente a finalidade principal do PCMAT continua sendo atender à legislação nas fiscalizações esporádicas, e não correspondendo à realidade das obras. A NR-35 acaba indo por esse mesmo caminho.
LEMBRANDO A PUBLICAÇÃO DA NR-35
Ou seja, mais normas, mais leis, mais regulamentos, não tem tido o poder de reverter os acidentes com queda, seja na construção civil, mesmo com as constantes mudanças recepcionadas pela NR-18 e a nova NR-35. Nas obras da Copa já são 5 o número de mortos por queda no trabalho em altura. .
Em amplos setores já há um consenso de que a legislação em vigor não é cumprida em grande parte por falta de fiscalização do Ministério e pelo pequeno valor das multas e não por falta de NRs. Além disso, um grande número de acidentes com queda ocorre no trabalho informal, significando que mais leis não vão dar cobertura a esse tipo de trabalhador. Ou seja, as estatísticas não refletem a realidade total e por isso o quadro deve ser bem pior.
Para não ficar só nas críticas, temos sugerido a criação de Agentes de Saúde do Trabalho, que poderiam exercer ações complementares à Auditoria Fiscal, antecipando nas empresas comportamentos inseguros e estimulando a conformidade legal, elaborando relatórios de visitas ao Ministério do Trabalho.
Essas ações poderiam ser desenvolvidas através dos convênios do MTE com os Estados ou Municípios, previstos na CLT. Provavelmente não se adota essa brecha legal por que não interessa às empresas mais transparência nas suas ações de segurança, visto são elas que em grande parte financiam as campanhas de futuros prefeitos e governadores que acabam ignorando projetos desse tipo.
A presença de Agentes Estaduais ou Municipais de Saúde do Trabalho, de preferência TST e coordenados por um profissional de nível superior, resultaria em avanços na prevenção, principalmente em cidades no interior, onde não existe fiscalização do Ministério, ou se existe é esporádica e insuficiente.
As situações de grave e iminente risco seriam comunicadas pelo órgão coordenador desses Agentes de Saúde do Trabalho à Justiça local, onde não houver Ministério do Trabalho. Mas seria preciso coragem política para adotar esse modelo.
Aliás, é bom ressaltar que Promotores do Ministério Público do Trabalho já estão preenchendo esta lacuna e exercendo as mesmas prerrogativas dos Auditores Fiscais em algumas cidades e com muito mais poderes, pois podem instaurar inquéritos.
Não se pode continuar com a lógica de que se não podemos aumentar a fiscalização, vamos aumentar as NRs. E se não se cumpre as NRs, fazer o que? agora, quem sabe, se crie uma nova NR para o “trabalho em estádios”.
Para o Governo, é fácil editar leis, e assim comandar o “efeito manada” tripartite – todos concordam com mais novas regras, transferindo para um futuro incerto as responsabilidades e os riscos e levando à suposição de que um novo porvir mais seguro virá com mais NRs. Não é uma política pública, penas uma atitude de fuga.
As evidências vão confirmando que mais NRs, como a 35 para o trabalho em altura, como foi dito neste Blog o ano passado, acabou sendo mais uma formalidade para desviar a atenção dos acidentes em expansão na construção civil, das falhas da NR-18 ( PCMAT) bem como para dissimular a inoperância do Ministério do Trabalho na fiscalização de todas as NRs. E salienta a omissão de Estados e Municípios que acham que essas ações são de exclusividade do Ministério do Trabalho. Governadores e Prefeitos precisam rever suas políticas de segurança no trabalho junto ao Ministério e não apenas ficar esperando que a Auditoria Fiscal resolva tudo. Também não se pode esperar que apenas o Ministério Público acabe ocupando todos os espaços deixados por essas omissões.
Esperemos pelas próximas NR mas sobretudo pelas próximas estatísticas.
Acredito que já passamos do tempo de implantar segurança do trabalho nas vidas e no cotidiano dos nossos colaboradores como um bem a ser cultivado em favor de uma melhor qualidade de vida, para eles e para suas famílias, pois os familiares quem sentem indiretamente a responssabildade de quem não teve acesso a segurança.
Os empresários não permitem que estes agentes de segurança possam atuar na prevenção para que eles continuem a mascarar o cenário real de suas empresas.
nós que defendemos os conceitos de segureança do trabalho Devemos lutar contra estes empresários que usam a segurança do trabalho como vaidade para se mostrar ou como desculpa para continuar sem ser fiscalizado.
apenas as fiscalizações com caracter legislativo podem reverter o cenario de falta de seguerança do trabalho no Brasil.
Bom dia, gostei da matéria meu caro, sou Técnico de Segurança do Trabalho, e uso meu espaço no Facebook para discutir com os colegas basicamente sobre isso. Penso que seria bem mais fácil, que as normas regulamentadoras do MTE, pudessem ser fundidas uma às outras, principalmente quando se tem alguma coisa em comum, a exemplo das NRs 19 e 20. Também deveriam ser extensivas a toda a cadeia produtiva, dos produtos e serviços relacionados a estes, no caso, acima citado, sobre as NRs 18 e 35 também penso o mesmo. E não é só isso, existem normas espaçadas sobre qualidade na produção, manuseio, transporte ou problemas ocasionados à saúde pela fabricação de produtos ou a realização de serviços. Aí segue espaçadamente normas de órgãos da iniciativa privada, públicas dos entes federados. É sabido que a Constituição Federal dá o direito aos entes federados de legislar, mas a mesma Carta Magna diz que os entes federados: estados, municípios e o Distrito Federal devem adequar suas normas às leis federais ordinárias, complementares e principalmente às normas contidas na Carta Magna. Em países desenvolvidos se cumpre em um só regulamento normas públicas e até feitas por órgãos da iniciativa privada, inerentes à leis que regem cada área a qual se aplica ou a segunda adequa-se à primeira. Deveria acontecer o mesmo aqui no Brasil, como o caso da NBR 16.280/2014 que deveria ser fundida a NR 18 por exemplo.